Crônicas do Cotidiano – Parte 1

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O despertador toca as 7:30h. Levanto, pego o celular e verifico as mensagens no whatsapp. Uma pauta num ministério e outra num palácio qualquer. Abro uma fresta na persiana e dou uma espiada. Acanhado, o sol desponta entre as nuvens. Corpo desperto e mente cansada. Volto para a cama, mas não durmo. Olho para o teto e começo a divagar. Pensamentos e sentimentos entram em ebulição. Uma tristeza inexplicável explode em choro. Olhos embaçados, lagrimas que escorrem pelo rosto e chegam a boca deixando o gosto de uma dor vazia. Achei que gostasse de estar sozinho, do silencio, da casa vazia, mas a realidade é bem diferente.

Decido encarar a rotina. Levanto novamente e vou até a cozinha. Uma colher de café para um copo de água gelada (isso é importante para manter o sabor dessa bebida viciante). Preparo meu pão com manteiga e coloco duas colheres de sopa de leite em pó na caneca que ganhei da minha madrinha antes de vir para Brasília. Lembranças da vida que deixei para trás quando decidi que era hora de mudar.

O aroma do café começa a surgir e espalhar-se pela casa. Pego o regador e molho a mini horta na janela da cozinha. Tomilho, salsinha, cebolinha, alecrim, verdinhas e vivazes. Um dos meus poucos prazeres. O café está pronto. Coloco na caneca, acrescento o açúcar e o leite e mexo umas três ou quatro vezes com a colher. Pego meu desjejum e vou para a sala.

TV ligada e sintonizada no telejornal matinal. Intercalo um gole de café com uma mordida no pão enquanto observo as notícias repetidas de todos os dias. Atenção especial a política “Apolítica” do nosso brasil, pois é nessa área que tenho atuado com mais frequência na fotografia. Um caso de corrupção aqui, políticos presos ali, governo em crise, servidores públicos sem salário, tudo dentro da “normalidade”. Meio pão na mão, mas não tenho fome para come-lo. Um último gole no café enquanto caminho para a cozinha. Guardo o que sobrou do pão pois detesto desperdícios. Caneca na pia para ser lavada mais tarde e vou para o quarto.

Brasília enfrenta uma crise hídrica e precisamos economizar, então tomo um banho rápido e antes de sair do chuveiro deixo a água quente bater por uns segundos na nuca. Pego aquele perfume que comprei quando fui para além-mar (o aroma traz a memória instantes de vida feliz). Levanto a cabeça e vejo no espelho a imagem embaçada de um ser humano insosso.

Coloco a roupa de trabalho, o relógio, pego meus equipamentos, carteira, documentos e chaves do carro e, antes de sair de casa, coloco meu rosto de guerra.

– Bom dia – diz o vizinho no elevador.

Com um sorriso que esconde minhas batalhas internas respondo com educação:

– Bom dia.

No térreo nos despedimos e vou para o carro. Besourinho está sujo. Penso: “Preciso lavar ele. Talvez na volta.”. Entro no carro e faço meu checklist. Retrovisores: Ok, posição do banco: Ok, cinto de segurança: Ok. Ligo o carro, acendo os faróis (em Brasília é obrigatório e para não correr o risco de levar uma multa já saio de casa com eles acessos) e dirijo em direção a EPVP.

Demorei um tempo para me acostumar com as siglas (EPTG, EPVP, QNE, 701N, Via L2 Sul, etc) mas agora prefiro elas aos nomes de ruas e estradas do Rio de Janeiro. Aliás, o transito daqui é melhor que o de lá também. Para quem estava acostumado a sair de casa as 4:50 da manhã e perder quase duas horas para chegar no centro do Rio, levar 40 min, percorrendo quase a mesma distância aqui em Brasília é o paraíso!